Fiquei triste vendo aquela pipa enroscada no galho da árvore. Rasgada, ela girava e girava, ao vento, como se quisesse escapulir. Mas não adiantava. Você já viu aqueles bichinhos de asas, quando eles caem em teias de aranha ? Era daquele jeito.
Tive dó. Pipa não foi feita para acabar assim.
Pipa foi feita para voar.
E é tão bonito quando a gente as vê, lá no alto...
Eu sempre quis ser uma pipa. Bem leve, sem levar nas costas nada que pese ( o que é pesado puxa a gente para baixo... ) Papel de seda, taquara fina que enverga, mas não quebra, linha forte, um pouquinho de cola e, pronto ! Lá está a pipa, pronta pra voar...
As cores e as formas ( que são tantas ! ) a gente escolhe aquelas que o coração está pedindo. Pipa, pra ser boa, tem que se parecer com os nossos desejos. ( E eu penso que as pessoas também, para serem boas, tem de ter uma pipa solta dentro delas...)
Não é preciso vento forte. Uma brisa mansinha deve levá-la até lá em cima, perto das nuvens. É por isso que elas têm de ser bem leves. O vento chega, as folhas das árvores tremem, e lá vão elas subindo, pra dentro do vazio do céu...
Só que tem uma coisa gozada. Pipa, pra subir, tem de estar amarrada na ponta de uma linha. E a outra ponta é uma mão que segura. É assim que a pipa conversa, através da linha. A mão puxa a linha e sente a linha firme, puxando pra cima, querendo ir.
E a pipa dizendo:
"Me deixa ir um pouco mais..."
Mas se a linha responde frouxa, é a pipa dizendo que está sem companheiro, o vento foi embora, e ela quer voltar pra casa...
Quando eu era menino, e me lembro, havia um homem...
Justo quando as pipas estavam lá em cima batizadas, carretilha sem mais linha para dar, ele vinha e comprava as pipas dos meninos. Pagava o preço justo. Só que o gosto dele era cortar a linha. Quem nunca brincou com elas vai pensar que, com a linha cortada, vão subir cada vez mais alto, nas costas do vento, sem nada que as segure. Mas não é assim. Quando a linha arrebenta, começam a cair. E vão caindo sempre, cada vez mais longe, tristes, abanando as cabeças...
O menino que a fez estava alegre, e imaginou que a pipa também estivesse. Por isto fez nela uma cara risonha, colando tiras de papel de seda vermelho: 2 olhos, um nariz, uma boca...
O pipa boa: levinha, travessa, subia alto...
Gostava de brincar com o perigo, vivia zombando dos fios e dos galhos das árvores.
"Vocês não me pegam, vocês não me pegam..."
E, enquanto ria, sacudia o rabo em desafio.
Chegou até a rasgar o papel, num galho que foi mais rápido, mas o menino consertou, colando um remendo da mesma cor
Amigos, tinha aos montões. E os seus olhos iam agradando à todos eles, sempre com aquela risada gostosa, contando casos...
Mas aconteceu um dia, ela estava começando a subir, correndo de um lado para o outro no vento, olhar para baixo e viu, lá num quintal, uma flor. Ela já havia visto muitas flores. Só que desta vez os seus olhos e os olhos da flor se encontraram, e ela sentiu uma coisa estranha. Não, não era a beleza da flor. Já vira outras, mais belas. Eram os olhos...
Quem não entende pensa que todos os olhos são parecidos, só diferentes na cor. Mas não é assim. Há olhos que agradam, acariciam a gente como se fossem mãos.
Outros, dão medo, ameaçam, acusam, e quando a gente se percebe encarados por eles, dá um arrepio ruim por dentro. Tem também os olhos que colam, hipnotizam, enfeitiçam...
A pipa ficou enfeitiçada. Não mais queria ser pipa. Só queria uma coisa: fazer o que a florzinha quisesse.
Ah ! Ela era tão maravilhosa. Que felicidade se pudesse ficar de mãos dadas com ela, pelo resto dos seus dias...
E assim, resolveu mudar de dono. Aproveitando-se de um vento forte, deu um puxão, arrebentou a linha e foi cair devagarinho, ao lado da flor.
E deu a sua linha para ela segurar.
Ela segurou forte.
Agora, sua linha nas mãos da flor, a pipa pensou que voar seria muito mais gostoso. Lá de cima ela conversaria com ela, e ao voltar lhe contaria estórias que ela pudesse dormir.
E ela pediu:
"Florzinha, me solta..."
E a florzinha soltou.
A pipa subiu bem alto e seu coração bateu feliz. Quando se está lá no alto é bom saber que há alguém esperando, lá em baixo.
Mas a flor, aqui debaixo, percebeu que estava ficando triste. Não, não é que estivesse triste. Estava ficando com raiva. Que injustiça que a pipa pudesse voar tão alto e ela tivesse de ficar plantada no chão. E teve inveja da pipa.
Tinha raiva quando via as pipas lá em cima, tagarelando entre si. E ela, flor, sozinha deixada de fora.
"Se a pipa me amasse de verdade não poderia estar feliz lá em cima, longe de mim. Ficaria o tempo todo aqui comigo..."
E à inveja juntou-se o ciúme.
Inveja é ficar infeliz vendo as coisas bonitas e boas que os outros têm e nós não.
Ciúme é a dor que dá quando a gente imagina a felicidade do outro, sem que a gente esteja com ele.
E a flor começou a ficar malvada.
Ficava emburrada quando a pipa chegava.
Exigia explicações de tudo.
E a pipa começou a ficar com medo de ficar feliz, pois sabia que isto faria a flor sofrer.
E a flor foi, aos poucos, encurtando a linha.
A pipa não mais podia voar.
Via, ali de baixinho, de sobre o quintal ( esta era toda a distância que a flor lhe permitia voar ) as outras pipas, lá em cima...
E sua boca foi ficando triste. E percebeu que já não gostava tanto da flor, como no início...
Esta estória não terminou.
Está acontecendo agora, em algum lugar...
E há 3 jeitos de escrever o seu fim.
Você é que vai escolher.
1. A pipa ficou tão triste que resolveu nunca mais voar.
"Não vou te incomodar com meus risos, flor, mas também não vou te dar a alegria de meu sorriso..."
E assim ficou amarrada à flor, mas mais longe dela do que nunca, porque o seu coração estava em sonhos de vôos e nos risos de outros tempos.
2. A flor, na verdade, era uma borboleta que uma bruxa má havia enfeitiçado e condenado a ficar fincada no chão. O feitiço só se quebraria no dia em que ela fosse capaz de dizer não à sua inveja e ao seu ciúme e se sentisse feliz com a felicidade dos outros. E, aconteceu que um dia, vendo a pipa voar, ela se esqueceu de si mesma por um instante e ficou feliz ao ver a felicidade da pipa. Quando isto aconteceu, o feitiço se quebrou e ela voou, agora como borboleta, para o alto e os dois, pipa e borboleta puderam brincar juntos...
3. A pipa percebeu que havia mais alegria na liberdade de antigamente que nos braços da flor. Porque aqueles eram braços que amarravam. E assim, num dia de grande ventania, e se valendo de uma distração da flor, arrebentou a linha e foi em busca de uma outra mão que ficasse feliz vendo-a voar nas alturas...
3 comentários:
Adorei esse texto é ótimo para crianças como eu e crianças de 5 a anos á até 10 anos de idade.Eu conheci este livro na minha escola eu tinha terminado O exercicio de matematica e disse a professo ra que ia pegar um livro na estante de livros ái ela disse que tinha um livro para eu ler e o livro era esse a pipa e a flor eu li entreguei a ela e me enteressei nele quando cheguei em casa fiz a minha lição de casa e fui dormir hoje resolvi pesquisar esse livro no google e achei no blogger li mais uma vez e gostei muito e vou ler muito mais vezes obrigada blogger!
á postem muito mais mais texto a mesma criança que postou que adorou o texto a pipa e a flor.
Fiz uma peça na escola com esse texto.
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